O processo de envelhecer engloba diversas mudanças no corpo. E, em alguns casos, podem ocorrer alterações que afetam a deglutição, ou seja, surge uma dificuldade na hora de engolir os alimentos.
Algumas pessoas ainda engasgam ou ficam com a sensação de que o alimento ficou parado na garganta. Esse problema bastante comum na terceira idade é chamado de disfagia.
Não há estimativas de quantos idosos são atingidos pela disfagia no Brasil. No entanto, estima-se que ocorra em 15% dos idosos e chegue a 30% quando eles estão internados em hospitais.
De acordo com Juliana Venites, fonoaudióloga e diretora da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia), a disfagia é mais frequente nos idosos porque ocorre um envelhecimento normal da biomecânica da deglutição.
“A musculatura responsável pela deglutição perde força e movimento, deixando essa faixa etária mais suscetível ao problema. Há também as doenças típicas do envelhecimento, como as demências que afetam o comando neurológico da deglutição”, explica.
Além disso, os idosos podem apresentar deficiências sensoriais como alterações do olfato e do paladar, o que reduz o apetite e a secreção salivar. Essas situações também atrapalham a deglutição.
Outras causas
O ato de deglutir é bastante complexo e envolve vários músculos e nervos.
Por isso, a disfagia pode ocorrer devido a um problema na boca, fraqueza na língua, na garganta ou no esôfago. “A deglutição envolve fases que são divididas em fase oral, fase faríngea e fase esofágica, então se inicia quando colocamos o alimento na boca, realizamos a mastigação, preparamos o alimento para ser engolido e o alimento passa pelo esôfago até chegar ao estômago.
Assim, a disfagia ocorre em qualquer uma dessas fases”, afirma Jackeline Pillon, fonoaudióloga da Rede de Hospitais São Camilo (SP).
As especialistas consultadas destacam que a disfagia está frequentemente associada a alterações neurológicas como AVC (Acidente Vascular Cerebral), traumatismo crânio encefálico e tumores, doenças degenerativas (como Esclerose Lateral Amiotrófica e Parkinson), doenças neuromusculares (como miastenia), além de Alzheimer e outras demências.
“Também ocorrem no pós-operatório de cirurgias de cabeça e pescoço, radioterapia, devido a efeitos colaterais de medicamentos e condições que afetam a respiração e a deglutição, como nas cardiopatias e doenças pulmonares. Há casos que ocorrem devido a longos períodos de intubação, traqueostomia ou por causa de distúrbios do esôfago”, afirma Elza Maria Lemos, otorrinolaringologista do Centro de Disfagia do Hospital Albert Einstein (SP).
Sintomas mais frequentes
Segundo Paulo Camiz, geriatra e professor da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) para identificar a disfagia, tanto os idosos quanto os cuidadores devem ficar atentos a alguns sinais na hora da alimentação.
“Se o idoso tossir depois de comer ou mudar a voz após se alimentar, isso já merece atenção. Os cuidadores precisam ter bastante paciência na hora das refeições e ficar de olho se o idoso se alimentou adequadamente ou está com alguma dificuldade de engolir”, afirma.
Os principais sintomas e sinais são:
Tosses e engasgos durante ou após a alimentação; Pigarros; Dificuldade para engolir o alimento; Sensação de alimento parado; Presença de restos de alimento na boca; Cansaço ao se alimentar; Azia e rouquidão; Incapacidade de controlar a saliva na boca; Escape nasal de alimento; Mudanças nos hábitos alimentares; Recusa alimentar; Aumento no tempo de refeição; Dor ao engolir; Mudança de voz; Babar em excesso ou ficar a boca seca; Febre sem causa aparente; Pneumonias de repetição; Perda de peso; Desnutrição; Desidratação.
Como é feito o diagnóstico
Após os sintomas, é importante buscar ajuda especializada para investigar o que está causando a disfagia. Podem ser solicitados exames específicos como a avaliação endoscópica da deglutição, em que se introduz um aparelho pelo nariz e são ofertados alimentos com corante e de diferentes consistências e volumes.
Há também o videodeglutograma, um exame que envolve radiação ionizante e utiliza o contraste. Em alguns casos, é necessário complementar a avaliação com outros exames, como endoscopia e raios-X.
“Apesar de sua alta prevalência, a disfagia ainda é subdiagnosticada e frequentemente não relatada por pacientes mais velhos, porque eles consideram as dificuldades de engolir como um processo normal durante o envelhecimento”, afirma Roberta Garcia, otorrinolaringologista do Centro de Disfagia do Hospital Albert Einstein.
A disfagia quando não diagnosticada precocemente causa a perda de peso, desidratação e desnutrição, e consequentemente óbito. Isso porque a pessoa não recebe os nutrientes ou líquidos essenciais para manter o corpo funcionando adequadamente.
“Os sintomas como engasgos, sensação de alimento parado e dor para engolir levam a pessoa a diminuir a quantidade de alimento ou líquidos ingeridos, o que em médio prazo causa a desnutrição e a desidratação”, completa Venites.
A fonoaudióloga destaca ainda que a disfagia impacta a saúde do idoso e de seus familiares, pois muitos terão uma dieta muito restrita ou ainda se sentem impedidos de comer livremente.
“Com esta privação, o idoso perde o prazer de saborear e a sua autonomia de escolha dos alimentos. Estes fatores levam ao isolamento social e à depressão. Desta maneira, o diagnóstico precoce da disfagia é fundamental para a manutenção da qualidade de vida do idoso”, afirma.
Os idosos que fazem um acompanhamento médico também podem realizar uma triagem para detectar a disfagia precocemente. Isso é feito por meio de testes simples que visam identificar rapidamente sinais e sintomas de distúrbios da deglutição.
“Esse teste pode ser aplicado por qualquer profissional da área da saúde que acompanhe o idoso ou durante uma eventual internação. A identificação precoce da disfagia colabora com a prevenção de agravos à saúde do idoso”, destaca Lemos.
Formas de tratamento
O tratamento da disfagia envolve a participação de diversos profissionais. Após o diagnóstico, o especialista determinará a dieta mais segura, as abordagens de tratamento e encaminhará o paciente para outros profissionais de saúde, de acordo com a causa.
O idoso poderá ser tratado por neurologistas, gastroenterologistas, geriatras, nutrólogos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais.
“Quando o idoso não tem condição para se alimentar por via oral, há a opção da sonda que vai do nariz até o estômago ou é colocada diretamente ao estômago. A indicação de uma ou outra vai depender do tempo em que a sonda vai ser necessária. Se houver melhora da deglutição, a sonda é removida”, explica Lemos.
Quando o idoso tem acúmulo de saliva por dificuldade de deglutir, são indicadas medidas para reduzir o problema como o uso de medicamentos ou injeção de toxina botulínica em glândulas salivares.
“O tratamento com um fonoaudiólogo também é importante e são realizados exercícios musculares, estimulações sensoriais e treinos com o alimento propriamente dito” complementa Venites.
Mudança na rotina
Muitas vezes, alguns ajustes na rotina alimentar e dieta são necessários. Pode ser preciso mudar a textura da dieta, espessamento de líquidos, mudanças no tamanho do alimento, manobras para deglutir mais vezes e/ou limpar a garganta após as deglutições. Isso permite que o idoso se alimente com segurança e tenha menos complicações relacionadas à disfagia, como ocorre com a pneumonia por aspiração, por exemplo.
Algumas dicas dos profissionais para que os idosos possam se alimentar com disfagia:
- Sentar-se e comer em posição ereta;
- Comer lentamente, com calma e mastigar bem os alimentos;
- Escolher alimentos macios e evitar os secos;
- Dar preferência por pequenas porções de alimento por vez;
- Evitar comer muito rápido ou deitar após a refeição.
Fonte: https://www.uol.com.br/vivabem/
Foto: Freepik