Xi, não consegui segurar! Perder a urina de forma involuntária é uma situação bastante constrangedora e um dos sintomas de quem tem a Síndrome da Bexiga Hiperativa (SBH). Nesses casos, como o próprio nome indica, há um funcionamento excessivo do órgão, o que gera uma vontade de fazer xixi com frequência, geralmente com forte sensação de urgência. E quando essas pessoas não conseguem chegar a tempo ao banheiro ocorre a incontinência urinária (vazamento da urina). O aumento da micção acontece inclusive durante a madrugada e é preciso despertar várias vezes. Esses sintomas são mais comuns nos idosos e acometem mais as mulheres do que os homens.
“Resumidamente, a bexiga contrai mais do que deveria e há uma hiperatividade do órgão. Por isso, a pessoa tem a sensação de que precisa fazer xixi com frequência, mas nem sempre elimina grandes quantidades de líquidos”, explica Paulo Camiz, geriatra e professor da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo).
Por que isso acontece?
Há várias razões que podem levar à bexiga hiperativa. Em alguns casos, acontece uma falha na comunicação entre a bexiga e o cérebro —que indica que ela precisa ser esvaziada, mesmo sem estar cheia. Em outros casos, os músculos do órgão sofrem alguma alteração, podendo estar mais ativos e provocando a vontade súbita de fazer xixi.
“É comum em homens mais velhos que tenham um aumento da próstata, que passa a pressionar o órgão. Costuma aparecer em quem teve doenças neurológicas, como AVC, Parkinson ou esclerose múltipla, pois elas afetam o cérebro ou a medula espinhal e a comunicação entre os órgãos”, explica Carlos D’Ancona, urologista e professor titular de Urologia na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).
Quem é mais propenso ao problema?
Estima-se que esse problema de saúde aumente progressivamente com a idade. Por conta do envelhecimento, há uma diminuição da capacidade de armazenamento da bexiga e alterações no tônus muscular. As mulheres também são mais atingidas, principalmente após a menopausa, devido a questões hormonais, e algumas por causa do parto vaginal, que causa uma alteração nos músculos pélvicos.
Também são fatores de risco as infecções do trato urinário e o uso de alguns medicamentos. Pessoas que têm diabetes, artrite, são obesas, depressivas e tabagistas também estão mais propensas a ter esse problema.
“A prevalência da bexiga hiperativa é bastante alta na população em geral, atingindo cerca de 5% dos homens e mulheres com menos de 40 anos e até 35% da população acima de 70 anos”, explica Cristiano Mendes Gomes, professor livre-docente de urologia da FMUSP e diretor do Departamento de Disfunções Miccionais da SBU (Sociedade Brasileira de Urologia).
Impacto na saúde mental e na qualidade de vida
Para algumas pessoas, os sintomas surgem inesperadamente. Por isso, é comum que essas pessoas comecem a limitar suas atividades sociais e busquem o isolamento, o que afeta a qualidade de vida e pode causar depressão. Um estudo da Unicamp realizado com mais de 270 mulheres que tinham sintomas de bexiga hiperativa mostrou que elas apresentavam depressão (59,8%) e ansiedade (62,4%). E de acordo com a pesquisa, essas questões emocionais surgem porque os sintomas desse problema de saúde afetam o trabalho, as interações sociais e familiares e as relações sexuais.
É comum que essas pessoas evitem situações nas quais possam correr o risco de urinar sem querer. “Existe uma grande preocupação em evitar lugares onde haverá dificuldade de acesso a banheiros. Há também impacto na vida sexual, já que eles podem ter desejo súbito de urinar durante a relação, tornando-se um transtorno para o paciente e seu parceiro”, afirma Henrique Rodrigues, urologista e membro titular da SBU. No caso dos idosos, alguns optam pelo uso de fraldas, o que representa um incômodo e uma despesa adicional, além do aumento do risco de alergias de pele. Além disso, há outro risco: a necessidade de urinar durante à noite nos idosos aumenta as chances de queda no trajeto da cama para o banheiro. Por isso, alguns se machucam, podem fraturar ossos e precisar de cirurgia.
O que pode ser feito para reduzir o problema?
Infelizmente, muitas pessoas que sofrem com a bexiga hiperativa não procuram ajuda por vergonha ou falta de informação e passam anos lidando com esse desconforto. A boa notícia é que o diagnóstico costuma ser clínico e simples, ou seja, em uma consulta o especialista —que pode ser urologista, geriatra ou ginecologista— avalia os sintomas, o histórico familiar e solicita exames de urina e ultrassom.
Em alguns casos, são necessários procedimentos mais complexos, como uma avaliação urodinâmica, exame que analisa a função da bexiga e os músculos da região. Isso tudo para se chegar a um diagnóstico correto e excluir o risco de outras doenças, como infecção urinária, cálculos renais ou tumores.
Há diversas alternativas de tratamento que variam de acordo com a gravidade dos sintomas. Geralmente, as medidas adotadas são mais simples e com menos chances de causar quaisquer efeitos colaterais.
Veja abaixo o que pode ser realizado para acabar de vez com a bexiga hiperativa ou pelo menos reduzir seus sintomas:
- Mudanças comportamentais
A primeira opção é mudar alguns comportamentos e o estilo de vida que contribuem com a urgência urinária. É recomendado limitar os alimentos e as bebidas que irritam a bexiga e aumentam a quantidade de urina. Entre eles, destacam-se a cafeína, os chás, as bebidas alcoólicas, os refrigerantes, o chocolate e os alimentos apimentados. Outra alternativa é realizar uma micção programada, ou seja, seguir um horário para ir ao banheiro determinado pelo médico. Dessa forma, estimula-se o controle do órgão. Perder peso também melhora os sintomas da bexiga hiperativa e é recomendado.
- Diário miccional
Os pacientes também são orientados a anotar quantas vezes vão ao banheiro e a quantidade de urina eliminada para conhecer melhor o funcionamento da bexiga. Essa estratégia ajuda a identificar se os sintomas pioraram após o consumo de alguns alimentos, por exemplo, ou se o tratamento está fazendo efeito.
- Fisioterapia do assoalho pélvico
Quem tem problema com a tonificação dos músculos pélvicos e incontinência urinária pode realizar exercícios específicos e indicados por um fisioterapeuta. Nesses casos, trabalham-se a força e a coordenação dos músculos da região. A contração muscular do assoalho pélvico é usada para obstruir a uretra e evitar a perda de urina. “Esse uso do controle muscular do assoalho pélvico faz parte de uma estratégia comportamental mais ampla, conhecida como supressão do desejo, na qual os pacientes aprendem uma nova maneira de responder à sensação de urgência. Essa técnica pode ser aprendida pela maioria dos pacientes e se tornou um elemento central do tratamento da incontinência de urgência ou SBH”, explica D’Ancona.
- Medicamentos
Os médicos costumam prescrever remédios para controlar e relaxar o músculo da bexiga. Eles ajudam a aliviar os sintomas, reduzem os episódios de urgência e a incontinência.
- Toxina botulínica
Em casos mais complexos ou que não tiveram boa resposta ao tratamento conservador, a aplicação da toxina botulínica (botox) na bexiga pode ser indicada. Essa substância ajuda a bloquear a contração do músculo, já que altera o funcionamento das terminações nervosas da região. É aplicada por meio de uma injeção e não afeta outros órgãos. Costuma ser bastante eficaz principalmente para controlar as perdas urinárias, mas seu efeito dura em média oito meses.
- Neuromodulação sacral
É indicada em pessoas que possuem bexiga hiperativa e incontinência urinária grave e sem resposta ao tratamento. Funciona como um tipo de marca-passo na bexiga visando regular a comunicação com o cérebro.
Como os cuidadores ou familiares podem ajudar
De acordo com os especialistas consultados por VivaBem, para o tratamento ser eficaz, principalmente em idosos, os familiares e cuidadores exercem um papel muito importante. “O principal fator é reconhecer esses sintomas urinários como uma queixa importante do idoso e não como parte do envelhecimento normal para que possamos tratá-lo adequadamente. A perda do controle da vontade de urinar mexe com a autoestima e é uma causa importante de institucionalização precoce”, afirma Alessandra Fariuza, geriatra da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Geralmente, são os cuidadores ou os familiares que estimulam a procura por um profissional e ajudam com os cuidados diários com a dieta, estimulam hábitos saudáveis e as micções preventivas para evitar a perda de urina. “Cabe a eles ajudar o paciente a entender que é um problema que afeta muitas pessoas e elas não devem entrar em depressão nem fugir do convívio social. Ao contrário, devem reconhecer o problema e procurar tratamento adequado. Os cuidadores dos idosos são fundamentais, pois monitoram a realização dos exercícios de fisioterapia e o uso de medicamentos quando indicado pelo médico”, finaliza Gomes. Revisão técnica: Carlos D’Ancona.
Fonte: Viva Bem – https://www.uol.com.br/vivabem
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