“A coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer”, já dizia Arnaldo Antunes ao cantar, em 2009, a música Envelhecer. Mais atual impossível, a canção fala com leveza, ironia e bom humor sobre a chegada da velhice – realidade cada vez mais comum no mundo e, principalmente, nos países em desenvolvimento, como no caso do Brasil. É o que revelam os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 2060, uma grande parcela da população brasileira será de idosos com mais de 60 anos. Hoje, são 20,6 milhões de idosos, o que representa 10,8% da população. Em 2060, esse número representará 26,7% do total.
“O meu problema são as dores que sinto nas juntas. Por isso, que eu costumo dizer que é pra juntar tudo e jogar fora”, brinca a aposentada Anastácia Carvalho Silva, de 63 anos. Moradora de Planaltina, cidade-satélite a aproximadamente 50km de Brasília, a aposentada retrata com bom humor realidade que atinge também grande parte dessa parcela da população que sofre com problemas decorrentes do avanço da idade.
Para amenizar a dores do tempo, dona Anastácia, como gosta de ser chamada, participa de um grupo gratuito de automassagem. “Já melhorei bastante. Antes eu não conseguia levantar o braço e agora eu já consigo e posso fazer outras coisas. As dores que eu sentia nos ombros, braços e pernas já melhoraram muito. Isso aqui alegra a vida da gente e nos dá mais vontade de lutar, porque se a gente ficar só em casa, não dá”, comemora a aposentada.
Totalmente gratuita, a atividade faz parte do Programa de Assistência Integral à Saúde do Idoso da Regional de Planaltina, uma iniciativa da Secretaria de Saúde do Distrito Federal junto ao Ministério da Saúde, com o objetivo de integrar os idosos em atividades de lazer, saúde e educação, além de socializa-los, dando a eles mais cidadania e facilitando o acesso aos serviços de saúde.
Iniciativas como essa espalham-se pelo país afora e, assim como o que acontece em Planaltina, já existem pelo Brasil inúmeros programas que visam dar melhor qualidade de vida às pessoas que já chegaram à terceira idade. Essas iniciativas demonstram a preocupação das autoridades com o envelhecimento da população.
Desafios
Diante dessa realidade, é importante entender o que isso representa do ponto de vista das políticas públicas e que tipos de desafios o Brasil terá de enfrentar. Estamos preparados? Como estamos nos organizando para cuidar de nossos idosos? Será esse o maior desafio do século XXI?
Para responder a essas perguntas, ouvimos especialistas e autoridades que há algum tempo trabalham com essa temática.
Como no caso das coordenadoras geral e adjunta da Saúde da Pessoa Idosa (Cosapi) – área do Ministério da Saúde vinculada ao Departamento de Atenção Especializada e Temática (DAET) da Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) –, Maria Cristina Hoffmann e Maria Cristina Lobo, respectivamente. Para elas, um dos maiores desafios para o país é a inclusão da pauta do envelhecimento e seus impactos na agenda prioritária das políticas públicas com ofertas concretas de intervenções.
Hoffmann cita também outros desafios, como o fortalecimento da articulação intersetorial com vistas a responder às demandas da pessoa idosa na sua integralidade, com ampliação de oferta de arranjos institucionais para dar conta da complexidade do cuidado à população que envelhece, envolvendo família e sociedade, oferta de cuidadores e apoio às famílias cuidadoras, atenção domiciliar e cuidados prolongados.
Questionada sobre como o Ministério da Saúde tem se preparado para o enfrentamento desses desafios, ela explica algumas diretrizes que compõem a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI – Portaria n. 2.528/2006). “A Política possui diretrizes que norteiam as ações nas três esferas do Sistema Único de Saúde (SUS), com foco na promoção do envelhecimento ativo e saudável, na oferta de atenção integral à saúde da pessoa idosa e na realização de ações intersetoriais, visando à integralidade da atenção. A PNSPI também destaca a importância de investimentos em educação permanente dos profissionais da saúde da pessoa idosa”, diz.
Em contrapartida, a técnica de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea) Ana Amélia Camarano cita outros desafios. Segundo ela, é preciso aumentar o número de crianças no país – hoje a taxa de fecundidade que nos últimos 50 anos era de 6,2 filhos, passou para 1,77 em 2013. “Na verdade, a população brasileira está caminhando para uma diminuição e quem trabalha e paga imposto daqui a alguns anos não vai mais contribuir. A pergunta é: quem vai fazer esse papel?”, questiona.
O outro desafio, segundo Camarano, diz respeito não ao fato de haver muitos ou poucos idosos, mas sim à garantia das condições de saúde e autonomia dessas pessoas. A pesquisadora afirma que é preciso repensar o conceito de idoso. “Essa definição de que idoso é uma pessoa com 60 anos ou mais é ultrapassada. É preciso avaliar melhor essa classificação, porque não importa se a pessoa tem 60 anos ou mais, mas sim se ela está em condições de trabalhar, de produzir, de não estar dependendo da previdência ou de cuidados especiais. Acho que são dois desafios que me parecem assim de imediato”, ressalta.
Já para o presidente do Centro Internacional de Longevidade do Brasil (ILC), o geriatra Alexandre Kalache, o aumento da expectativa de vida da população e, consequentemente, o aumento da população idosa trazem desafios importantes para o país. “A expectativa de vida não aumenta só ao nascer. As pessoas que chegam aos 60 anos também continuam vivendo cada vez mais e isso exige políticas públicas mais adequadas”. A afirmação foi feita durante a sua participação no Fórum Saúde Brasil, promovido pelo jornal Folha de S. Paulo no último dia 27 de março.
E assim como a pesquisadora do Ipea, o geriatra também alertou para a diminuição da população, tendo em vista que há pelo menos seis anos a taxa de fecundidade no Brasil está abaixo do nível de reposição. Segundo ele, é importante que se invista na educação pública se quisermos ser bem cuidados e termos jovens produtivos no futuro, uma vez que hoje as mulheres com baixa renda e com tempo de educação menor que 8 anos têm o dobro da taxa de fecundidade daquelas mulheres de classe média/alta. “São essas crianças de hoje, que não estão sendo bem educadas, que vão cuidar de nós e nos sustentar à medida que envelhecemos. Se elas não tiverem o mínimo de educação básica, não serão boas cuidadoras. Então até em causa própria é necessário pensarmos muito nesse desafio do abismo hoje que há em termos de taxa de fecundidade”.
Para ele, outro aspecto importante a ser considerado diz respeito à transição demográfica e epidemiológica. Segundo ele, cada vez mais as mortes de pessoas com mais de 60 anos são decorrentes de doenças crônicas. No entanto, o envelhecimento não deve ser considerado culpado, pois não podemos desconsiderar que a população está envelhecendo com bolsões de extrema pobreza. “Não vamos culpar o envelhecimento por essas doenças crônicas. Nós temos de ter muita atenção antes de responsabilizar o indivíduo, pois não podemos culpá-lo por ter sido pobre, excluído e negligenciado. Temos de ter a solidariedade de tratar essa pessoa que nunca foi cuidada, com respeito e dignidade”.
Kalache também chama a atenção para a importância do cuidado, pois à medida que uma população envelhece, o cuidado é a dimensão principal na área da saúde. “É importante proporcionar o autocuidado, dar sustento e suporte para que o idoso possa se cuidar, afinal ninguém deve estar tão interessado em se cuidar que ele próprio”.
Impactos na Saúde e Políticas Públicas: como trabalhar essa questão?
O acelerado processo de envelhecimento populacional no Brasil impacta e traz mudanças no perfil epidemiológico dos brasileiros, principalmente porque é caracterizado por importante heterogeneidade e grandes desigualdades sociais.
“Essa peculiaridade exige das políticas sociais uma articulação intersetorial entre elas, como a assistência social e a previdência para responder às demandas crescentes de cuidado”, afirma a coordenadora adjunta da Saúde da Pessoa Idosa, Maria Cristina Lobo.
Para ela, fica claro que os impactos dessas mudanças na área da saúde acontecem pelo aumento da demanda por serviços de saúde, tanto públicos quanto privados, na necessidade de se investir em ações de promoção e prevenção, na atenção ambulatorial e hospitalar especializada e na atenção domiciliar para o cuidado com a pessoa idosa.
Lobo cita dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2008 que indicam que 73% da população idosa são usuários do SUS, 51% têm domicílio cadastrado nas Equipes de Saúde da Família (ESF) e 53% utilizam posto ou centro de saúde como primeiro local de atendimento. “Isso reforça a necessidade de priorizar investimentos nas ações de promoção, prevenção e preservação das condições de saúde, considerando suas especificidades e ampliando o acesso qualificado à pessoa idosa, preferencialmente nos territórios”, diz.
A coordenadora da Cosapi indica ainda outro impacto significativo que são as demandas de cuidado, seja para apoiar as famílias cuidadoras ou suprir ausência de vínculos sociais. Ela explica que é necessário um esforço conjunto com envolvimento principalmente da Saúde e da Assistência Social para ampliar, criar novos dispositivos de cuidados a partir de experiências já realizadas, como, por exemplo, as experiências de cuidado que envolvem a figura do cuidador, seja no âmbito familiar ou institucional, a oferta de serviços dia e atenção domiciliares, além de reordenar as instituições de longa permanência de forma que estas se constituam em opção humanizada de moradia para idosos, principalmente para aqueles em situação de vulnerabilidade social e sem vínculo familiares.
Para amenizar os impactos que essas transições acarretam ao SUS, o Ministério da Saúde tem trabalhado com diversas linhas de atuação (confira todas as ações do MS na entrevista completa no site). Uma das mais importantes é a implementação do Modelo de Atenção Integral à Saúde da Pessoa Idosa. “Como é do conhecimento, o SUS adotou como orientação para organizar a atenção, a constituição e atuação em Redes de Atenção à Saúde (RAS). A necessidade de propor um modelo de atenção específico surgiu como resposta para organizar a atenção à população idosa no SUS. Esse modelo tem como foco potencializar e articular ações existentes nas RAS, incluindo as especificidades desse grupo”, explica Maria Cristina Hoffmann.
Entre os objetivos específicos propostos no modelo, estão a busca por melhores resultados sanitários nas condições crônicas, a diminuição das referências para especialistas e hospitais, o aumento da eficiência dos sistemas de saúde, a produção de serviços mais custo-efetivos e melhorias na satisfação dos usuários em relação aos serviços de saúde e a ampliação e qualificação do acesso da pessoa idosa ao SUS, a partir das suas especificidades.
Vale ressaltar que o modelo foi elaborado e validado no VIII Colegiado de Gestores de Saúde da Pessoa Idosa, realizado em novembro de 2013 e será lançado no XXX Congresso Nacional do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), em junho deste ano.
O Ministério da Saúde participa da Comissão Interministerial instituída pelo Decreto Presidencial n. 8.114/2013, que estabelece o Compromisso Nacional para o Envelhecimento Ativo e tem o objetivo de articular esforços da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios em colaboração com a Sociedade Civil, para valorização e defesa dos direitos da pessoa idosa. A Comissão é coordenada pela Secretaria dos Direitos Humanos e é composta por 17 ministérios.
“Nós também estamos envolvidos diretamente no fortalecimento do Colegiado Nacional de Saúde da Pessoa Idosa, que é um fórum composto por gestores dos estados e do Distrito Federal, dos municípios capitais e acima de 500 mil habitantes com reuniões presenciais semestrais e agenda permanente de trabalho”, complementa Hoffmann.
Para conhecer a implementação da Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa e o esforço de gestão de estados e municípios, a Cosapi conduziu um projeto de mapeamento das experiências exitosas de gestão, seguindo critérios como o alinhamento com princípios e diretrizes do SUS, com a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa e com as diretrizes para organização da Rede de Atenção à Saúde com a população idosa. O projeto considerou o caráter inovador, a relevância dos resultados e o potencial para ser replicado em outras realidades.
A pesquisadora do Ipea Ana Maria Camarano lembra que a sociedade conseguiu grande avanço ao emplacar a Política Nacional do Idoso, mas faz uma ressalva: “Nós não conseguimos implementá-la, tanto que nove anos depois foi criado o Estatuto do Idoso por causa do fracasso da política”. E vai além.
“Nós temos condições de desenvolver políticas públicas e sociais eficazes para enfrentar essa nova realidade, mas para isso é preciso que os governantes tratem esse problema como prioridade. Condições há, basta querer. O que preocupa é que o Brasil ainda não conseguiu resolver a saúde para a população. Ainda há uma dificuldade de atendimento, de acesso da população como um todo e consequentemente isso afeta também a população idosa”.
Camarano também acredita na importância das ações intersetoriais. “Essa questão do envelhecimento tem de ser trabalhada intersetorialmente. Por exemplo: acabar com o preconceito que existe em relação aos idosos é uma questão de educação que começa desde o ensino básico, ensinando os jovens a valorizar o papel do idoso e seu papel social. São necessárias políticas de cuidado e de acessibilidade para essas pessoas, ou seja, é preciso trabalho conjunto dos ministérios da Cidade, da Educação, da Saúde etc.”
Além disso, explica, “é muito importante a inserção dos idosos na construção dessas políticas, pois muitas vezes elas são elaboradas sem ouvir os principais interessados e acabam não sendo tão eficientes quanto deveriam”.
Revolução da Longevidade
Durante o Fórum Saúde Brasil, Alexandre Kalache falou sobre a Revolução da Longevidade. “Revolução é aquilo que acontece de súbito e que tem impacto em toda a sociedade. É exatamente isso que está acontecendo hoje no Brasil e também no mundo. Estamos diante de uma revolução da longevidade”, afirmou.
Por isso, é importante, segundo o geriatra, traçar uma perspectiva do curso de vida, pois os idosos querem envelhecer mantendo a independência e a qualidade de vida. “Se nós chegarmos bem aos 80 anos, continuaremos a ser um recurso para a sociedade, se ela se preparar para tal. O problema está naquele idoso que entra em declínio. Aí sim o envelhecer é um fardo”.
O médico alertou para a transição do curso de vida. “Antes a aposentadoria durava apenas dois, três anos e com um salário baixo. Hoje nós vamos nos aposentar e viver mais uns 30 anos com muita experiência para continuar contribuindo para a sociedade. Mas será que ela está preparada? Uma sociedade que pensa no idoso vai nos beneficiar a todos. Quem for amigo do idoso será amigo de todos”, refletiu.
O presidente do ILC concluiu sua apresentação afirmando que é preciso promover o envelhecimento ativo, dando oportunidades de saúde, de educação continuada e de participação na vida social. “Essa revolução veio para ficar e todos nós devemos abraçá-la independentemente da nossa área de atuação”.
Preconceito: é possível acabar?
Exclusão, maus-tratos, negação. Negar a velhice e cultuar a juventude. Negar o passado, negar a história, cultuar o hoje e o efêmero. Como envelhecer diante de uma sociedade mergulhada na valorização daquilo que é novo? Como lidar com a contradição de uma sociedade que, ao mesmo tempo em que busca alternativas que prolonguem a expectativa de vida das pessoas, renega o tão natural ato de envelhecer e exclui os seus idosos, abandonando-os, muitas vezes à própria sorte?
“É importante investir em campanhas publicitárias com foco na mudança de paradigma sobre o envelhecimento em uma sociedade que valoriza exageradamente a juventude e não valoriza a sua história”, observa Cristina Hoffmann.
Segundo ela, o conhecimento acumulado pelos anos vividos pode ser aproveitado e investido em políticas de reinserção no mercado de trabalho e de possibilidades de participação social, protagonismo e contribuição para sociedade.
Hoffmann destaca um ponto importante. “Na saúde, temos de trabalhar o conceito do envelhecimento ativo, desvincular envelhecimento de doenças crônicas, reconhecer que o envelhecimento traz perdas, mas que é possível viver esta fase com qualidade de vida”.
E finaliza citando trecho adaptado do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), 2012, que se refere ao processo de envelhecimento como celebração e desafios: “O envelhecimento é um triunfo do desenvolvimento. O aumento da longevidade é uma das maiores conquistas da humanidade. As pessoas vivem mais em razão de melhorias na nutrição, nas condições sanitárias, nos avanços da medicina, nos cuidados com a saúde, no ensino e no bem-estar econômico. Mas a população em envelhecimento também apresenta desafios sociais, econômicos e culturais para indivíduos, famílias, sociedades e para a comunidade global. E isto pode e deve ser planejado para transformar os desafios em oportunidades”.
O que outros países estão fazendo?
O Brasil vem implantando, desde 2012, o projeto-piloto dos Cuidados Continuados Integrados (CCI), fruto da parceria e intercâmbio com a Catalunha, na Espanha, onde o modelo funciona desde a década de 1980, e com Portugal, que há cerca de sete anos vem adotando o CCI.
O modelo, que começa com a abordagem do paciente no hospital pela Equipe de Gestão de Alta (EGA), tem como objetivo orientar a continuidade da atenção dada não apenas aos idosos, mas aos cidadãos em geral com necessidade de acompanhamento, seja em questões agudas ou crônicas.
Uma das principais características do CCI é a articulação entre as equipes multidisciplinares, integrando o atendimento pós-alta com as equipes das atenções básica e domiciliar e com os centros de referência em reabilitação física, efetivando a integralidade da assistência e o prosseguimento do cuidado a pacientes em situação clínica estável que careçam de reabilitação ou adaptação decorrentes de processo clínico, cirúrgico ou traumatológico.
“A prisão assistencial que alguns hospitais de média e alta complexidade estavam percebendo, devido ao incremento de patologias crônicas e degenerativas e de pacientes que precisavam de cuidados variados, foi um dos principais motivadores para o início desse projeto”, relata a dra. Montserrat Dolz, diretora da Gesaworld S.A. e consultora do projeto no Brasil.
Ela conta que não havia oferta de serviços além da atenção básica e da atenção hospitalar clássica, causando diariamente grande volume de cuidados, o que também aconteceu no Canadá e nos Estados Unidos da América, conforme relata Dolz.
“Começando a tratar pessoas com problemas de cronicidade e dependência, viu-se que o modelo clássico de abordagem médico-assistencial prestado nos hospitais ficava curto e incompleto para as necessidades que os pacientes apresentavam. Porque o hospital clássico orienta um tratamento para curar e faz uma intervenção pontual. Então, os pacientes com patologias ou multipatologias, com condições crônicas ou com idade avançada, tinham de ser tratados de outro jeito”, explica.
A experiência da Catalunha e de outros países que têm serviços públicos de saúde, como o Brasil, corrobora a necessidade de reforço da Atenção Primária à Saúde (APS), a fim de fazer a devida abordagem de pacientes com uma ou mais patologias, crônicas ou degenerativas, que podem ficar em casa e se deslocar à Unidade Básica de Saúde para fazer seus controles.
Nesse aspecto, o papel do cuidador também é fundamental. “Muitas vezes ele é da família, portanto, parte do trabalho dessas equipes é educar os familiares, mostrando como deve ser o acompanhamento para que os pacientes possam receber os cuidados adequados às suas necessidades”, explica Montserrat.
O Dr. Luiz Maria Ramos Filho, superintendente de Assistência Social do Hospital Samaritano, executor do projeto pelo Proadi-SUS, ressalta que o CCI depende muito da mudança da visão da equipe de atenção por ser uma proposta multidisciplinar não centrada no cuidado médico. O projeto está em fase de implantação em Teresina, no Piauí, em Rebouças, no Paraná, e em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.
Ele explica que, embora não seja uma política específica para a população idosa, ela é grande beneficiária do programa e que nos países europeus, por conta da população mais envelhecida, há um cuidado assistencial diferenciado, até mesmo com o financiamento da assistência social. “Muitas vezes a necessidade social do paciente é muito maior que a necessidade médica. Em algumas situações, o volume de recursos financeiros pode, inclusive, inverter-se, sendo maior o aporte por parte da assistência social que da saúde”.
“O principal é formar as Equipes de Gestão de Alta nos hospitais de referência com lotação maior. Estas equipes, assim como a regulação, são fundamentais para o direcionamento do tratamento ou para a internação domiciliar”, ressalta Ramos Filho.
Na região de Franca, em São Paulo, foram inauguradas, em agosto de 2013, Unidades de Cuidados Continuados nas cidades de Pedregulho e Ipuã, com apoio da Secretaria de Saúde do estado, do Centro de Estudos Augusto Leopoldo Ayrosa Galvão (Cealag) e da Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes do Estado de São Paulo (Fehosp), custeadas pelo Ministério da Saúde.
A Santa Casa de Franca, como hospital estratégico da região, é a que mais encaminha pacientes para essas unidades, tendo como primeira referência a Unidade de Pedregulho, para onde já foi transferido o maior número de pacientes que recebem todo o cuidado de saúde e de apoio social de forma continuada e integrada, centrada em sua recuperação global, promovendo a sua autonomia e melhorando sua funcionalidade.
Cuidados Prolongados
Um dos desdobramento do intercâmbio internacional foi a publicação, em 2012, da Portaria n. 2.809, que estabelece os Cuidados Prolongados como retaguarda da rede de atenção de urgências e com unidades inspiradas no CCI. Os Cuidados Prolongados já estão sendo incorporados ao SUS, implantados nos hospitais São Julião e na Santa Casa de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, e na Santa Casa de Ipuã, em São Paulo.
“Esta é uma estratégia intermediária entre os cuidados hospitalares de caráter agudo ou crônico e a atenção domiciliar destinada a usuários estáveis que necessitem de reabilitação ou adaptação por sequelas, problemas clínicos, cirúrgicos ou traumatológicos”, explica Ana Paula Cavalcante, coordenadora de Atenção Hospitalar do Departamento de Atenção Hospitalar e Urgência da Secretaria de Atenção à Saúde, do Ministério da Saúde (SAS/MS).
Os Cuidados Prologados são uma das possibilidades que os gestores têm para a reabilitação da pessoa com perda de autonomia potencialmente recuperável. São unidades de 15 a 25 leitos, com equipe multiprofissional composta por fisioterapeuta, fonoaudiólogo, psicólogo, assistente social, técnico de enfermagem, enfermeiro e médico.
Diferente do CCI, a Equipe de Gestão de Alta não está prevista nos Cuidados Prolongados, cuja normativa sugere que a alta seja administrada pelo Núcleo de Acesso e Qualidade, tanto para a unidade de Cuidados Prolongados quanto para outra retaguarda clínica, principalmente nos hospitais gerais, explica Ana Paula.
“Unidades pequenas podem ser efetivamente personalizadas. Esta é uma oportunidade de utilizar essas unidades espalhadas em todo Brasil com número reduzido de leitos e uma baixa complexidade na assistência”, completa.
Fonte: http://www.conass.org.br/
Foto: Freepik